Rev. Paulo Cesar Lima.
Esta é uma questão que, à primeira vista, parece elementar, mas não é. E, para o total desconforto de alguns cristãos, o problema agrava-se quando nos deparamos com fatos nitidamente comprobatórios de que há pessoas que parecem receber uma “ajudinha extra” em tudo que fazem, enquanto outros, ao contrário, nada do que fazem dá certo.
Há histórias estranhíssimas apontando esta dolorosa realidade; histórias de pessoas que nada fizeram e nada fazem para serem melhores e, no entanto, conseguem sempre o mais difícil. Em contrapartida temos trabalhadores que se esforçam até o seu limite e não levam nada. Eu não estou falando aqui de probabilidades, mas de fatos avassaladoramente inexplicáveis e inexoráveis.
É indiscutível dizer que existem algumas mostragens nos episódios da vida que nos deixam sem qualquer explicação, mesmo que tentemos explicar. Pior: na tentativa de responder à questão em tela, o fazemos de maneira simplória. Na realidade, a intenção das explicações simplistas é quase sempre fechar o assunto acerca do qual não compreendemos e contra o qual nos sentimos impotentes.
É por essas e outras explicações anestésicas, mas nada racionais, que acabamos sofrendo do mal de Asafe, o líder dos cantores de Davi.
O cantor de Israel, ao sair um dia do seu casulo existencial sagrado, enfrentou a pior crise da sua vida. Para ele era algo asfixiante, esmagador: viu que os “ímpios” (os não religiosos) estavam levando a melhor ao sabor de uma vida sem Deus. Ele que apostara tudo em Deus parecia menos privilegiados. O que estava acontecendo?
Na verdade, quando perguntamos se há os que têm mais sorte na vida, queremos de fato fazer uma outra pergunta: por que o ímpio parece estar levando a melhor?
Jó e Eclesiastes são os únicos livros – em toda a Bíblia Sagrada – a ressaltarem uma maneira contrária de pensar a vida do justo e do ímpio.
Jó, descrito na “torá oral evangélica” como paradigma da submissão, da suportabilidade, homem de comportamento ilibado em relação à dor, é a figura mais rebelde do Antigo Testamento. É rebelde na sua maneira de tratar as interpretações acerca do sofrimento do justo: reclama, combate, insurge-se, repele qualquer explicação da ortodoxia religiosa, não aceita a dor, reivindica justiça, chama Deus a um tribunal para uma disputa justa...
A maneira tradicional de pensar o sofrimento de Jó é oposta a tudo o que está desvelado nas Escrituras Sagradas. Nossos intérpretes – parece – pegaram o “bonde andando” e agora não sabem para onde vão e nem têm como pará-lo. Jó, portanto, é a história de dor, angústia, sofrimento que torna o homem mais sagrado alguém de carne e osso. Além do mais, para Deus vale mais o tratamento do nosso caráter do que o nosso bem estar.
O autor de Eclesiastes, por sua vez, abre mão do ortodoxismo do seu tempo e se arremete contra a dicotomia determinista, que coloca o ímpio sempre em situação de desvantagem na história. O “pregador” reverbera dizendo que nem sempre isso é realidade:
“Sim eu sei que dizem: ‘Se você temer a Deus, tudo lhe correrá bem; mas não correrá bem para os maus. A vida deles passa como a sombra: morrerão jovens porque não temem a Deus.’ Mas isso não tem sentido. Vejam o que acontece no mundo: muitas vezes os bons são castigados, e não os maus; e os maus são premiados, e não os bons.”
Há mais de quinhentos anos, um filósofo grego de grande saber, considerado oráculo dos deuses, já deblaterava que algumas situações por que passamos jamais serão compreendidas racionalmente. No fundo, o velho filósofo tinha razão. De fato, nada dói tanto que a dor incompreendida. Primeiro dói porque é dor. E segundo dói pelo fato de não se saber por que está doendo.
Toda esta inquietação existencial é em face de um axioma cristão que se constitui premissa fundamental da religião cristã: “Se Deus está conosco, mal nenhum pode nos ocorrer”.
Partindo deste sufrágio cristão, o questionamento de Gideão feito ao anjo é justo: “Se o Eterno está com o nosso povo, por que está acontecendo tudo isto com a gente?” Levando-se em conta que o juiz de Israel entende – como todos nós – o fato de que a presença de Deus é sempre razão de vitória - questão fechada e incontestável para muitos cristãos – o que fazer para entender os fatos contrários?
A partir desta Escritura episódica e do questionamento do juiz de Israel, entendo que, com urgência, precisamos reler e reescrever o conceito de sorte e azar na história humana. Isto porque este conceito é absolutamente relativo. Já que a sorte de hoje pode se tornar no azar de amanhã e vice-versa. Mais: não há quem viva só de azar nem tampouco de sorte; esses elementos circunstâncias por vezes se alternam na vida.
Acompanhe o meu raciocínio e descubra a gangorra da vida entre a sorte e o azar:
Fábio amava Alcione. Mas Alcione nada queria com Fábio – que azar de Fábio. Depois de tantas tentativas, Fábio consegue convencer Alcione de se casar com ele – que sorte de Fábio. Após o casamento, o casal descobre que não pode ter filhos – que azar de Fábio e Alcione. Fábio e Alcione conseguem tratamento e o esperado filho nasce – que sorte. Após o nascimento da bela criança, Alcione morre – que azar para Fábio. O menino Filipe cresce e quando completa a idade de 18 anos o pai lhe presenteia com um belo cavalo puro sangue – que sorte. A primeira cavalgada com o belo cavalo Filipe cai e quebra a perna – que azar. Dias depois, chega uma convocação do exército para o jovem Filipe, para que este se apresente com urgência a fim de ser enviado para o campo de guerra; Filipe não pode ir pelo fato de ter sua perna quebrada – que sorte. Filipe...
Como o leitor pode notar, eu poderia continuar esta história interminável. No entanto, com ela eu só quero destacar a alternância que há entre a sorte e o azar e como os dois elementos se ajustam na existência humana, revelando-nos que não há determinismo em nenhum desses elementos.
Do exposto, para amenizar a dor do leitor, deixo esta palavra de consolação:
A maioria dos homens que conseguiram
se tornar os mais ricos do mundo veio
das classes menos favorecidas.
Esta é uma questão que, à primeira vista, parece elementar, mas não é. E, para o total desconforto de alguns cristãos, o problema agrava-se quando nos deparamos com fatos nitidamente comprobatórios de que há pessoas que parecem receber uma “ajudinha extra” em tudo que fazem, enquanto outros, ao contrário, nada do que fazem dá certo.
Há histórias estranhíssimas apontando esta dolorosa realidade; histórias de pessoas que nada fizeram e nada fazem para serem melhores e, no entanto, conseguem sempre o mais difícil. Em contrapartida temos trabalhadores que se esforçam até o seu limite e não levam nada. Eu não estou falando aqui de probabilidades, mas de fatos avassaladoramente inexplicáveis e inexoráveis.
É indiscutível dizer que existem algumas mostragens nos episódios da vida que nos deixam sem qualquer explicação, mesmo que tentemos explicar. Pior: na tentativa de responder à questão em tela, o fazemos de maneira simplória. Na realidade, a intenção das explicações simplistas é quase sempre fechar o assunto acerca do qual não compreendemos e contra o qual nos sentimos impotentes.
É por essas e outras explicações anestésicas, mas nada racionais, que acabamos sofrendo do mal de Asafe, o líder dos cantores de Davi.
O cantor de Israel, ao sair um dia do seu casulo existencial sagrado, enfrentou a pior crise da sua vida. Para ele era algo asfixiante, esmagador: viu que os “ímpios” (os não religiosos) estavam levando a melhor ao sabor de uma vida sem Deus. Ele que apostara tudo em Deus parecia menos privilegiados. O que estava acontecendo?
Na verdade, quando perguntamos se há os que têm mais sorte na vida, queremos de fato fazer uma outra pergunta: por que o ímpio parece estar levando a melhor?
Jó e Eclesiastes são os únicos livros – em toda a Bíblia Sagrada – a ressaltarem uma maneira contrária de pensar a vida do justo e do ímpio.
Jó, descrito na “torá oral evangélica” como paradigma da submissão, da suportabilidade, homem de comportamento ilibado em relação à dor, é a figura mais rebelde do Antigo Testamento. É rebelde na sua maneira de tratar as interpretações acerca do sofrimento do justo: reclama, combate, insurge-se, repele qualquer explicação da ortodoxia religiosa, não aceita a dor, reivindica justiça, chama Deus a um tribunal para uma disputa justa...
A maneira tradicional de pensar o sofrimento de Jó é oposta a tudo o que está desvelado nas Escrituras Sagradas. Nossos intérpretes – parece – pegaram o “bonde andando” e agora não sabem para onde vão e nem têm como pará-lo. Jó, portanto, é a história de dor, angústia, sofrimento que torna o homem mais sagrado alguém de carne e osso. Além do mais, para Deus vale mais o tratamento do nosso caráter do que o nosso bem estar.
O autor de Eclesiastes, por sua vez, abre mão do ortodoxismo do seu tempo e se arremete contra a dicotomia determinista, que coloca o ímpio sempre em situação de desvantagem na história. O “pregador” reverbera dizendo que nem sempre isso é realidade:
“Sim eu sei que dizem: ‘Se você temer a Deus, tudo lhe correrá bem; mas não correrá bem para os maus. A vida deles passa como a sombra: morrerão jovens porque não temem a Deus.’ Mas isso não tem sentido. Vejam o que acontece no mundo: muitas vezes os bons são castigados, e não os maus; e os maus são premiados, e não os bons.”
Há mais de quinhentos anos, um filósofo grego de grande saber, considerado oráculo dos deuses, já deblaterava que algumas situações por que passamos jamais serão compreendidas racionalmente. No fundo, o velho filósofo tinha razão. De fato, nada dói tanto que a dor incompreendida. Primeiro dói porque é dor. E segundo dói pelo fato de não se saber por que está doendo.
Toda esta inquietação existencial é em face de um axioma cristão que se constitui premissa fundamental da religião cristã: “Se Deus está conosco, mal nenhum pode nos ocorrer”.
Partindo deste sufrágio cristão, o questionamento de Gideão feito ao anjo é justo: “Se o Eterno está com o nosso povo, por que está acontecendo tudo isto com a gente?” Levando-se em conta que o juiz de Israel entende – como todos nós – o fato de que a presença de Deus é sempre razão de vitória - questão fechada e incontestável para muitos cristãos – o que fazer para entender os fatos contrários?
A partir desta Escritura episódica e do questionamento do juiz de Israel, entendo que, com urgência, precisamos reler e reescrever o conceito de sorte e azar na história humana. Isto porque este conceito é absolutamente relativo. Já que a sorte de hoje pode se tornar no azar de amanhã e vice-versa. Mais: não há quem viva só de azar nem tampouco de sorte; esses elementos circunstâncias por vezes se alternam na vida.
Acompanhe o meu raciocínio e descubra a gangorra da vida entre a sorte e o azar:
Fábio amava Alcione. Mas Alcione nada queria com Fábio – que azar de Fábio. Depois de tantas tentativas, Fábio consegue convencer Alcione de se casar com ele – que sorte de Fábio. Após o casamento, o casal descobre que não pode ter filhos – que azar de Fábio e Alcione. Fábio e Alcione conseguem tratamento e o esperado filho nasce – que sorte. Após o nascimento da bela criança, Alcione morre – que azar para Fábio. O menino Filipe cresce e quando completa a idade de 18 anos o pai lhe presenteia com um belo cavalo puro sangue – que sorte. A primeira cavalgada com o belo cavalo Filipe cai e quebra a perna – que azar. Dias depois, chega uma convocação do exército para o jovem Filipe, para que este se apresente com urgência a fim de ser enviado para o campo de guerra; Filipe não pode ir pelo fato de ter sua perna quebrada – que sorte. Filipe...
Como o leitor pode notar, eu poderia continuar esta história interminável. No entanto, com ela eu só quero destacar a alternância que há entre a sorte e o azar e como os dois elementos se ajustam na existência humana, revelando-nos que não há determinismo em nenhum desses elementos.
Do exposto, para amenizar a dor do leitor, deixo esta palavra de consolação:
A maioria dos homens que conseguiram
se tornar os mais ricos do mundo veio
das classes menos favorecidas.
2 comentários:
Querido Pastor Paulo,com base nessa sua reflexão sobre a sorte,gostaria que o senhor me respondesse porque se todos pecaram,existe o rico e o pobre,e segundo a Bíblia foi Deus que fez o rico e o pobre,ou seja,uns tem e outros não tem.Uma classe é escrava da outra e ambas foi Deus que as fez.Já que todos pecaram porque todos não são ricos ou então todos pobres?Obrigado
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